domingo, 4 de setembro de 2011

Flexibilização e Cerceamento de Direitos Trabalhistas frente à Competitividade dos Mercados




O fenômeno da globalização, a partir dos anos 90, foi um facilitador da migração de unidades produtivas para áreas periféricas e para países em desenvolvimento, onde os custos da produção são nitidamente mais baixos (exemplo mais evidente – China) e desde então, o capital tem apontado como “solução” para o seu fortalecimento, a flexibilização das relações trabalhistas, bem como a sua própria desregulamentação.
Grandes multinacionais instalam-se em países que subsidiam impostos e fornecem mão de obra a custos baixos – proporcionada pela regulamentação trabalhista flexível e/ou falta de fiscalização por parte do Estado.

Nesse contexto, tal “flexibilização”, muitas vezes, ocorre através de acordos tripartites entre Estado, empresas e sindicatos que ignoram interesses dos trabalhadores, argumentando o combate ao desemprego e ao enfrentamento das dificuldades econômicas globais ocasionadas pelo alto nível de competitividade no mercado internacional.



Entretanto, o elevado nível de modernização das empresas, a busca incessante por técnicas e engenharias que tornem os processos produtivos cada vez mais favoráveis à elevação da produção e à redução de custos, além do desenvolvimento de novas tecnologias e a aplicação de teorias da administração gerencial nas empresas, com os mesmos objetivos, são fatores redutores do nível de mão de obra e, portanto conseqüente desemprego. Sendo essa a lógica da chamada 3ª Revolução Industrial, a técnico-científica. Em suma, servindo à lógica do capital.

O Brasil, em uma aparente contraposição à flexibilização dos direitos do trabalhador, instituiu na Constituição Federal de 1988 princípios garantidores de direitos mínimos, sendo o mais importante o princípio da dignidade humana. Desse princípio extrai-se que o trabalho humano não pode ser “coisificado”, tratado como simples mercadoria e, o que pode ser vendido é o resultado da disposição da energia de trabalho do trabalhador. No Brasil, o direito do trabalho é um direito autônomo e considera a relação de emprego uma relação contratual, mas uma relação que não se amolda aos contratos clássicos civilistas. O direito do trabalhador deve ser desigual, diferenciado, pois se pressupõe que a relação entre empregador e empregado seja desigual, sendo o trabalhador a parte mais fraca da relação. A relação de emprego sequer precisa ser comprovada por um contrato assinado entre as partes, bastando haver identificados os requisitos caracterizadores da relação de emprego, sendo que a característica mais evidente é a da subordinação do empregado com relação ao empregador.


Mesmo com toda essa “proteção”, o Estado é condescendente com relação às irregularidades, à exploração e usurpação de direitos dos trabalhadores, haja vista a constatação de inúmeras empresas autuadas – reiteradamente – por reduzir seres humanos (homens, mulheres, crianças e idosos) à condição de escravo – uma total contradição ao atual Estado Democrático de Direito brasileiro.


Exemplo atual dessa situação não ocorreu nas já “manjadas” fazendas produtoras de erva-mate, tomates e outros produtos primários ou nas carvoarias que têm freqüentes denúncias de trabalho escravo. Ocorreu na capital de São Paulo, nas fabriquetas de roupas terceirizadas por uma importante marca internacional de modas – a ZARA, pertencente ao grupo espanhol Inditex. A multinacional se utilizava de mão de obra totalmente ilegal e ainda, explorava mão de obra infantil. As pessoas encontradas pelo Ministério do Trabalho e Emprego eram submetidas a condições degradantes de trabalho, sujeitas a jornadas extenuantes de até 16 horas/dia, com cerceamento de liberdade (pela cobrança e desconto irregular de dívidas dos salários – o modo mais cruel de exploração conhecido como truck system – e pela proibição de deixar o local de trabalho sem prévia autorização). As vítimas da referida empresa foram aliciadas na Bolívia e no Peru, com promessas de melhores condições de vida. Chegando aqui, foram obrigadas a trabalhar por meses durante muitas horas por dia apenas para pagar as dívidas quanto ao transporte de vinda para o Brasil, quanto aos documentos e “vales” que faziam aos trabalhadores com intuito de aumentar suas dívidas. Sem mencionar as condições insalubres de trabalho às quais os imigrantes eram submetidos. Um total desrespeito à dignidade humana desses trabalhadores, super explorados, com seus direitos trabalhistas e previdenciários cerceados, abarcados pelo empresário usurário através de seus altos lucros a custas do trabalho desses seres totalmente marginalizados e desamparados pelo Estado. 


Quantas mais empresas, nesse momento, estão a explorar seres humanos? Quantas mais empresas, nesse momento, estão a lucrar através da subtração de direitos de trabalhadores? E o acontece com as empresas que atuam de forma honesta e legal no mercado? É possível competir com aquelas?


O alto nível de competitividade nos mercados é um desafio a todos os atores envolvidos. Com ele, sobrevêm diversos problemas sociais, a começar pelas irregularidades nas relações trabalhistas.